Quando o nome da ministra Ideli Salvatti (PT) surge no celular do deputado Eduardo Cunha (RJ), o líder do PMDB na Câmara — e desafeto do Palácio do Planalto — faz questão de não atender. Prefere negociar com outros integrantes do primeiro escalão do governo. Titular mais longeva da Secretaria de Relações Institucionais, a ex-senadora ocupa o cargo responsável pela articulação com o Congresso há dois anos. Contudo, sofre pela autonomia limitada, fruto do perfil centralizador da presidente Dilma.
— É difícil a Ideli decidir algo. Ela repassa o recado a Dilma — resume um deputado petista.
O espaço na articulação ficou mais reduzido após a onda de manifestações no país que forçaram a entrada do ministro da Educação, Aloizio Mercadante, no circuito. Apesar de negociar diariamente com deputados e senadores, a ministra viu Mercadante assumir a liderança do comitê de crise do governo.
Na última quinta-feira, o vice-presidente Michel Temer (PMDB) discutiu o plebiscito da reforma política com ministros e líderes de partidos. Temer e Mercadante tomaram conta da reunião, apresentaram os pontos de vista do governo. A catarinense pouco falou.
A condução da reunião expôs que a reforma política, prioridade de Dilma, ficou nas mãos de Mercadante e Temer. Já Ideli assessora a negociação, mas recebeu a missão de tocar o cotidiano, em missões como a aprovação do uso dos royalties do petróleo na educação e saúde, a análise de vetos presidenciais e a aprovação de medidas provisórias que estão para vencer.
Dona do apreço do ex-presidente Lula, com a fidelidade apreciada por Dilma, a ministra catarinense recebe elogios da chefe, com quem tem acesso direto e quase diário. Na última sexta-feira, passou mais de cinco horas em reuniões com Dilma, incluindo o almoço.
Parlamentares reconhecem este esforço, mas se queixam dos poderes limitados da ministra e da postura da presidente. A petista anunciou no mês passado cinco pactos, incluindo o plebiscito da reforma política, sem consultar o Congresso. A situação provocou a ira de deputados e senadores, já desgostosos por acordos não cumpridos. Em negociações anteriores, o governo prometeu liberar emendas, que nunca deixaram o campo da promessa.
— A Ideli virou escudo do governo. A Dilma decide, não avisa o Congresso e a ministra ouve as reclamações. Precisa ter fibra para aguentar — analisa um assessor petista.
O contexto impõe dificuldade extra ao trabalho, como destaca o deputado Décio Lima (PT-SC). A articulação questionada é ruim nesta nova maratona de negociações — trazida pelos cinco pactos —, diante de uma base aliada grande e nada fiel.
— O governo tem alianças demais. Tem partido com ministério que não vota com o governo — reclama Décio Lima, presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.
Um exemplo é o PP, titular da pasta das Cidades, responsável pelos investimentos em mobilidade urbana, ponto de revolta nas manifestações populares. Presidente da sigla, o senador Ciro Nogueira (PI) cobra maior autonomia para Ideli e Gleisi Hoffmann, ministra-chefe da Casa Civil. Do contrário, defende a saída das duas. Líder do PSB na Câmara, Beto Albuquerque só acredita em melhora na articulação se o Planalto resolver, de fato, ouvir o Congresso.
— Não é culpa da Ideli. A dificuldade da presidente dialogar inviabiliza o trabalho de qualquer ministro.